sexta-feira, 27 de maio de 2016

Diversidade religiosa na escola e a discriminação aos evangélicos

FLORIDA CHRISTIAN UNIVESITY
CAMPUS UNIFUTURO
NÚCLEO NORDESTE
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
Ensaio Científico: Diversidade religiosa na escola e a discriminação aos evangélicos
Disciplina: Antropologia da Educação
Prof. Dr: Cristian Paiva
Aluna: Maria das Dores Nogueira Nobre Araújo

I  - INTRODUÇÃO.
            Este ensaio tem como principal objetivo pensar antropologicamente a diversidade cultural religiosa no âmbito escolar e por fim busca romper com preconceitos vividos pela classe minoritária (os evangélicos). Porém, antes de abordarmos o assunto  com base na legislação brasileira, do ponto de vista  dos Direitos humanos e estado laico, queremos nos reportar a práticas cotidianas escolares vexatórias e excludentes para com os alunos evangélicos e ou filhos de evangélicos.            
            Pretende-se por meio deste discutir o multiculturalismo religioso que permeia as escolas públicas da rede municipal de ensino no município de Ibicuitinga – Cé, e por fim lança-se o convite aos leitores e a todos os que fazem a educação a repensar  politicas pedagógicas e sociais que excedam o etnocentrismo,  uma vez que o “ensino religioso”  impregnado de dogmas catolicistas já não  pode mais ser considerada  comum à todos.
            Queremos ainda propor o rompimento de ideias e atitudes dicotômicas: católicos X evangélicos (assembleianos pentecostais), uma vez que todos os sujeitos que compõem a diversidade cultural religiosa devem ser tratados como pessoas que tem identidades e comportamentos plurais, que se transformam e contradizem normas comportamentais de um determinado grupo outrora dominante.  
Abordaremos a postura dos professores frente à diversidade cultural religiosa, conjecturando-as aos pensamentos de Maria Candau, e outra referências bibliográficas  sugeridos nos estudos da  disciplina antropologia da educação.
II - DESENVOLVIMENTO

            Não se pode falar em multiculturalismo e religião, sem lembrarmos a história dos hebreus, pois o principal legado que este povo deixou as demais nações  foi no âmbito religioso. Que os hebreus  foram os primeiros povos a adotar o monoteísmo, e que seu Deus se  destacou-se na literatura, principalmente na Bíblia Sagrada também não é novidade.  Porém poucos sabem que a missão dos profetas hebreus, era educar / ensinar a Lei de Deus ao povo de Israel. Portanto, temos na história dos hebreus o primeiro plano de ensino religioso.
            Neste mesmo contexto também  é válida a afirmativa  de que a Civilização hebraica  foi, a mais marcante e expressiva de que se tem conhecimento na história da humanidade.  Os hebreus se destacaram por sua religião e pelas contribuições na literatura. Desde a antiguidade a educação religiosa e  secular deve ser obrigação da família. Segundo a bíblia sagrada até que a criança viesse a ter maturidade era competência da família,  ensiná-la e orientá-la a viver segundo os princípios cristãos.  Vejamos, portanto, algumas citações bíblicas que fundamentam essa ideia:
Gênesis 18: 19    (Palavra de Deus  a Abraão)
“Porquanto Eu o escolhi, para que instrua seus filhos e todos os seus descendentes acerca de conservarem-se no Caminho do SENHOR, praticando o que é justo e direito, a fim de que o SENHOR faça vir sobre Abraão tudo quanto lhe tem prometido!”

Deuteronômio 4: 9 (Palavra de Deus a Moises)
“Tão somente guarda-te a ti mesmo e cuida bem da tua própria alma, a fim de que jamais te esqueças dos muitos sinais que os teus olhos contemplaram, e para que tais vivas recordações nunca se apartem do teu coração, em nenhum dia da tua vida. Ensina-as com dedicação aos teus filhos e aos teus netos.”

Deuteronômio 6:7 ( Moises instrui o povo hebreus, segundo revelação divina)          
“Tu as ensinarás com todo o zelo e perseverança a teus filhos. Conversarás sobre as Escrituras quando estiveres sentado em tua casa, quando estiveres andando pelo caminho, ao te deitares e ao te levantares.”

Salmo 78:1 à 7  (Daví – Judá – Masquil testemunham sobre seus pais)  
1-Escutai o meu ensino, povo meu; inclinai os vossos ouvidos às palavras da minha boca.
2 - Abrirei a minha boca numa parábola; proporei enigmas da antiguidade,
3 - coisas que temos ouvido e sabido, e que nossos pais nos têm contado.
4 - Não os encobriremos aos seus filhos, cantaremos às gerações vindouras os louvores do Senhor, assim como a sua força e as maravilhas que tem feito.
5 -Porque ele estabeleceu um testemunho em Jacó, e instituiu uma LEI em Israel, as quais coisas ordenou aos nossos pais que as ensinassem a seus filhos;
6 - para que as soubesse a geração vindoura, os filhos que houvesse de nascer, os quais se levantassem e as contassem a seus filhos,
7 - a fim de que pusessem em Deus a sua esperança, e não se esquecessem das obras de Deus, mas guardassem a palavra da LEI;

Efésios 6: 4  (Apóstolo Paulo admoesta aos crentes de Efésios)
E vós, pais, não provoqueis a ira dos vossos filhos, mas educai-os de acordo com a disciplina e o conselho do Senhor.

1ª Samuel 12: 26  (Relato a vida do profeta Samuel, criado e ensinado na sinagoga pelo sacerdote  Eli)
E o jovem Samuel ia crescendo, cada dia mais, em estatura e em graça e estima por parte do SENHOR e de todas as pessoas à sua volta.

1º Samuel 12: 2 (Samuel apresenta Saul como rei em Israel, e fala da importância de instruir o povo no caminho “certo”.
De agora em diante, será o rei quem marchará à vossa frente. Já estou velho e de cabelos brancos, e meus filhos habitam entre vós. Fui vosso guia desde a minha mocidade até hoje.…

            Não temos a pretensão de concordar ou discordar do Ensino religioso nas escolas, mas refletir sobre as metodologias e recursos que são utilizados para esse fim. Assim sendo, chamamos o leitor a refletir sobre o seguinte questionamento: Nos dias atuais a quem interessa o Ensino Religioso? Seria essa uma obrigação da escola? Da família? Ou do Estado?  O que mesmo se deve ser ensinado? 
            Muito se tem falado em diversidade cultural nas escolas, mas quando essa diversidade cultural, está ligada a religiosidade  falta argumentos e conhecimentos legais. Acredita-se, porém, que nem todos conhecem os documentos legais que amparam as escolas para esse fim, fato este que gera os equívocos que tanto provoca o descompromisso, preconceito e exclusão das minorias.                  
            Na verdade a educação brasileira foi principiada em um catolicismo com características medievais: indulgente, intolerante e inquisitório, traços esse que ainda se refletem nossa postura. Acredita-se ainda que a Lei Federal, 9394/96, que deveria ser adaptada ao projeto  politico pedagógico escolar, não é sequer conhecida por todos os que ministram o ensino religioso.
            É inconcebível aos professores  contemporâneos assumir o  pensamento auspicioso de que somos um pais puramente cristão só por imposição dos primeiros colonizadores. A legislação nos garante que somos um país laico, portanto deveríamos adotar uma posição neutra no campo religioso. Deveríamos, portanto, defender a liberdade religiosa a todos os alunos e não mais cultivarmos o proselitismo religioso como faziam os jesuítas.
            O Artigo 5º da  Constituição Brasileira (1988) prever a liberdade de crença religiosa, além de   proteção e respeito às manifestações religiosas:  “VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença...” Entretanto, a laicidade do Estado fica ameaçada em detrimento do ensino religioso nas escolas públicas brasileiras.
            Fundamentada na LDB e  revista nova Escola (2009)  faremos um resgate histórico  da educação brasileira, para que se discutir o caráter educativo da laicidade do Estado para a esfera pública
            Acredita-se que por meio desta leitura, venhamos compreender que   a igreja católica não deveria ter mais nenhuma soberania, em relação  ao poder e controle educativo, pois o   Regime jurídico de União Estado-Religião, nesse caso, a União com a igreja Católica vigorou no período de  1500 a 1889, com a chegada dos jesuítas trazidos ao Brasil pelo então governador geral Tomé de Souza, que por muito tempo cultivou o catolicismo como sendo a religião oficial do império.
            Outro fato importante no âmbito da  história educacional,  Compreende os anos  1890-1930, quando foi criado o Regime jurídico de Plena Separação Estado-Religiões.   Neste período presidente Manoel Deodoro da Fonseca, assina o Decreto 119-A que  proíbe a intervenção da autoridade federal e dos Estados federados em matéria religiosa e consagra a plena liberdade de cultos a qualquer religião. A partir  de então entra em vigor a primeira Constituição republicana que define a separação entre o Estado e quaisquer religiões ou cultos,  e o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos é totalmente leigo.  Nesse mesmo período todas as religiões são aceitas no Brasil e podem praticar sua crença e seu culto livre e abertamente. 
            Entretanto, os anos 1931-2008, também marcam a historia da educação brasileira. Pois nessa época nasce o    Regime jurídico de Separação Atenuada Estado-Religiões. Em  1931, por meio do Decreto de Getúlio Vargas o ensino religioso volta  as escolas publicas, porém em caráter facultativo. Ainda em 1934 é promulgada uma nova Constituição, cujo artigo 153 define:
"O ensino religioso será de frequência facultativa e ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno manifestada pelos pais ou responsáveis e constituirá matéria dos horários nas escolas públicas primárias, secundárias, profissionais e normais". 

            Acredita-se que a intenção do decreto é boa, mas a nova promulgação da Constituição tentava retomar algo que “deu certo” para os católicos que eram e ainda é a classe dominante. Entretanto percebe-se que há uma contradição com a realidade,  ou talvez seria mesmo uma descarada manipulação dos fatos. Pois no município de Ibicuitinga, lócus de observação da problemática, e acredita-se que em centenas de outros municípios, o ensino religioso sempre foi obrigatório, sempre priorizou-se dogmas e liturgias católicas, esses eram tidos como CERTOS, como a LEI de DEUS, o “resto” era apenas heresias.  E lamenta-se que até hoje o proselitismo ainda predomina descaradamente, em relação  à denominação católica.
            Em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB 9394/96), de dezembro de 1996, definia que: 
"O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis, em caráter: 

I - confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu responsável, ministrado por professores ou orientadores religiosos preparados e credenciados pelas respectivas igrejas ou entidades religiosas;


            Até hoje essa data é conhecida e celebrada como a “era de ouro”, pois o padre do município ministrava as aulas, tornando-as em verdadeiros catecismos. Pastores evangélicos e outros líderes religiosos não era considerados aptos para esta função, pois, não tinham respaldo cultural perante a sociedade para tão grandiosa missão.  Além disso, as aula de religião aconteciam  no horário normal das aulas, e as crianças, de outra religião eram obrigadas a estarem na sala de aula ouvindo doutrinas contrarias a sua religião. Falo doutrina, por que as aulas de religião até bem pouco tempo atrás era doutrinação religiosa mesmo, e até o presente momento ainda se percebe isso.
            Diante do contexto descrito, não há como negar  a discriminação sofrida pelos alunos não católicos. Se a opção religiosa dos pais não é considerada, imagina dos alunos que ainda são crianças e não sabem argumentar. Será que a estes é dado o direito de ausentar-se da sala de aula se o assunto contraria sua religião? E os alunos que não tem religião, os ateus e filhos de ateus, ou mesmo de religiões não cristãs, será que a escola pensa neles como cidadãos normais?
            Se a escola entende  a religião como algo que compõe a identidade do sujeito, deverá tratá-la como algo que transcende papeis sociais, pedagógicos e doutrinários e não menosprezando uma em detrimento de outra(s). Neste sentido, não convém  que a escola trate a pluralidade religiosa de forma redutiva, pois assim fazendo, finda por excluir os não católicos, de muitas de suas atividades curriculares. 
            Como resultado do preconceito exacerbado que opera no seio escolar, existe  filhos de evangélicos que negam sua fé. Muitos ainda chegam a deixar a escola por seres vítimas de bullyng, apelidos pejorativos como “os aleluias, santos (as) do pau oco”, são obrigados a ouvirem calados deboches às expressões sagradas como: “A paz do Senhor, o sangue de Cristo tem poder”.   Meninas ainda crianças que são criticadas pelas vestimentas se diferenciada das demais. Ou caso contrário, se vestir-se igual as demais logo vem os aconselhamentos e cobranças de amigos e profissionais hipócritas.
            O chocante de tudo isso é que quando se trata de abuso aos evangélicos, tudo parece normal aos olhos de muitos gestores, que simplesmente aconselha-os a perdoarem, pois é isso que a religião manda.
            Uma prova de que não se trata de ataque ou contra-ataque ao proselitismo católico, vejamos o que diz LOURO GABRIEL (1997. P 62), quanto a estrutura escolar:
A escola delimita espaços. Servindo-se de símbolos e códigos, ela afirma o que cada um pode (ou não pode) fazer, ela separa e institui.
(.....)  Através  de seus quadros, crucifixos, santos e esculturas, aponta aqueles / as que deverão ser modelos e permite, também, que os sujeitos se reconheçam ou não nesse modelo.                               
            Ainda no tocante a citação supracitada, podemos correlaciona-la, as festas juninas, a festa da pascoa denominada pela igreja católica como semana santa,  e as festas tradicionais dos /das padroeiros(a) de cada localidade do município. A escola sempre está marcando presença, e os festejos contam como dias letivos no calendário escolar, entretanto negam o sábado aos adventistas.  Que leitura se pode fazer destas festas os alunos não católicos?  Quem está ali representado? È cabível e louvável que a escola trabalhe desde cedo o respeito ás diferenças, mas nessas festividades  como fica os que não proferem a fé católica? Excluídos?  Na verdade, parece que isso pouco importa, por eles são minoria!  
            Não estamos querendo dizer que não interessante os festejos aos santos.  Essa atividade seria produtiva, se os alunos fossem levados à observar, analisar, buscar compreender e até possível á preferir, entretanto a escola impõem à todos o culto a Deuses estranhos, desconsiderando assim princípios e crenças religiosas e diversificadas.  
            Para Reinaldo Fleuri (2000. p:75), dentro de uma perspectiva intercultural religiosa a escola deverá ser concebida como construção de processos em que diferentes pessoas desenvolvem relações de reciprocidade entre sí. A esse respeito o autor preconiza que:  “As ações e reações entre sujeitos criam, sustentam e modificam contextos relacionais. Esses contextos, por um lado, configuram referências culturais, a partir das quais  os atos individuais adquirem significados”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

            Que fique claro ao público leitor que perante a Constituição Federal não importa qual a religião predominante no país, as escolas devem aceitar e respeitar  toda a diversidade religiosa. E é necessário ampliar as estratégias metodológicas para que se possa garantir ao aluno o que já está garantido por lei: A não violação e  a liberdade da consciência e de suas  crenças.
            Convida-se portanto a escola à fundamentar seus projetos e politicas pedagógicas em uma cultura de paz e não em competições, e que comece a pensar o ser humano como uma espécie e não apenas como ser individual, pois, se assim fizermos,   talvez ponhamos fim a intolerância religiosa e as demais.
            Finaliza-se, portanto este texto apelando aos professores, gestores, que venhamos  a nos dispor de nossas convicções religiosas, que venhamos a respeitar a diversidade. Claro que o que “ensina, o que gerencia” é um individuo que também tem direito as suas próprias escolhas e que tem suas convicções de fé, mas, enquanto  exerce a função profissional, guarde-as para sí.  É imprescindível que os que fazem a educação sejam aptos á compreender e aceitar as diferenças, mesmo que, às vezes, discordem conceitualmente.
            Não estamos sugerindo que escola, família ou estado  negociem seus valores ou que abdiquem de suas escolhas, apenas que espeite os dos outros. Respeito sempre é bom,  principalmente quando se trata de convicções quanto ao sagrado, pois sabemos que as principais atrocidades que a humanidade comete é na maioria das vezes em nome da fé.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BÍBLIA SAGRADA. Traduzida em Português  por Joao Ferreira de Almeida. Revista e Corrigida. Ed, 1995. Barueri, SP. Sociedade bíblica do Brasil, 2004.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil: texto constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais nos 1/1992 a 68/2011, pelo Decreto Legislativo nº 186/2008 e pelas Emendas Constitucionais de Revisão nos 1 a 6/1994. – 35. ed. – Brasília : Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2012. 454 p. – (Série textos básicos ; n. 67)
CANDAU, Vera Mª (org) Ensinar e aprender: sujeitos, saberes e pesquisa. Rio de Janeiro: DP&A, 2000 – texto  Multiculturalismo e interculturalismo nos processos educacionais. REINALDO MATIAS  FLEURI.
Decreto de Getúlio Vargas   http://revistaescola.abril.com.br/img/gestao-escolar/ acessado em 25-07-2015
LOURO, Guacira Lopes. Gênero, sexualidade e educação. Uma perspectiva pós – estruturalista - Petrpolis, RJ. ed: Vozes, 1997.  6ª edição2003


Nova Escola online.  As leis brasileiras e o ensino religioso na escola pública. 29 de Outubro de 2009. Disponível também no site: Biblioteca Virtual  FAPESP  http://www.bv.fapesp.br/namidia/noticia/33156/leis-brasileiras-ensino-religioso-escola/           acessado em 25 – 07- 2015.

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